sábado, 13 de junho de 2020

Monster - A Ressureição do Mal


Monster- A Ressureição do Mal
(Rawhead Rex, 1986)
A família Hallenbeck está visitando as belas paisagens do vilarejo de Rathmore, no interior da Irlanda. Enquanto o pai, Howard (David Dukes), se dedica a fotografar túmulos e lugares sagrados para uma pesquisa que está fazendo sobre paganismo nas antigas comunidades rurais irlandesas, sua esposa Elaine (Kelly Piper) e seus filhos pequenos, Robbie (Hugh O’Connor) e Minty (Cora Lunny) estão entediados e querem ir embora daquele lugar.



Perto dali, três agricultores estão tentando derrubar um antigo monólito de aparência fálica que está no meio de uma lavoura. Após tentar de todo jeito derrubar a coluna de pedra, dois deles desistem e vão para casa jantar. O terceiro permanece na lavoura, lutando contra o monólito, até que consegue movê-lo. Imediatamente uma névoa começa a sair do solo. De repente, um raio atinge o monólito, que cai ao solo. Uma criatura horrenda emerge da terra e mata o pobre agricultor que o libertou. 


O monstro, uma antiga divindade/demônio pagão que foi aprisionada naquele lugar há muito tempo atrás, começa a matar os moradores do pequeno vilarejo, despedaçando seus corpos e comendo pedaços de sua carne. Enquanto isso, a família Hallenbeck resolve partir, mas na viagem são afligidos por uma tragédia. Em um momento de distração de seus pais, o pequeno Robbie é atacado pelo monstro e acaba sendo devorado. Tomado pela ira e com o desejo de vingança em seu coração, Howard resolve dar um fim na terrível criatura que matou seu filho. Para isso, ele precisará decifrar os sinais que estão espalhados pela igreja do vilarejo e que parecem ser a chave para derrotar a terrível entidade maligna sedenta de sangue.






Lançado em 1986, com base em um conto do famoso autor britânico Clive Barker (criador dos livros de “Candyman” e da saga “Hellraiser”) e dirigido por George Pavlou (que já havia trabalhado com Barker um ano antes, no filme “Transmutations”, que foi lançado no Brasil com o título de “Subterrâneos- A revolta dos mutantes”), Rawhead Rex (algo como Rei Cabeça Pelada, em uma tradução livre) foi um filme pouco apreciado em sua época, devido principalmente a sua divulgação limitada e ao aspecto inegavelmente tosco da obra. Durante muito tempo o filme esteve esquecido, até ser resgatado por uma nova legião de fãs e se tornar um verdadeiro filme Cult, reverenciado por muitos como uma pérola do cinema trash.
No Brasil a obra foi exibida à exaustão no extinto Cine Trash, da Rede Bandeirantes (apresentado pelo saudoso Zé do Caixão), onde recebeu diversos nomes diferentes, uma forma muito safada que os produtores do programa encontraram para fazer parecer que se tratavam de filmes diferentes e manter vivo o interesse do público (essa prática era bastante comum na época e era usada por várias emissoras e em vários programas). Porém, o nome que ficou mais associado com o filme foi Monster- A Ressurreição do Mal, um título bastante estúpido e que não tem nada a ver com o filme em si, o que apenas contribui para aumentar o status de filme 100% trash. Independente do título, o filme também se tornou Cult para o público brasileiro, criando uma legião de fãs brazucas que se dedicam a manter viva a memória dessa obra. Até hoje é possível encontrar pessoas que buscam encontrar esse filme através da internet.
Com um orçamento irrisório, bem abaixo dos valores das grandes obras do cinema da época, o filme sofreu com a falta de recursos. Isso fica logo evidente no visual da criatura/monstro: uma simples máscara de borracha, que não permite quase nenhuma expressão facial além de uma cara de raiva constante, olhos vermelhos esbugalhados e uma bocarra escancarada, e um traje preto esfarrapado que mais parece uma roupa de roqueiro de uma banda de heavy metal, não compõem um visual muito assustador. Isso sem falar no cabelo ridículo do monstro, que ostenta um moicano de última qualidade. O traje do monstro foi feito em uma peça única de látex, como uma forma de diminuir os custos de produção. Esse traje era muito desconfortável e limitava demais os movimentos do ator Heinrich Von Schellendorf, que interpretou o monstro. O resultado disso na tela foi horrível. Não é possível fazer com que o público tenha medo vendo aquela criatura toda mal feita, andando de maneira travada, com as pernas abertas e os braços duros. Para piorar, o filme nem sequer tenta esconder seu monstro, que é apresentado logo de cara em cenas filmadas de dia, com bastante claridade e de corpo inteiro, além de vários closes em seu rosto/máscara, deixando toda a tosqueira à mostra.


Outro ponto que contribui para a tosquice generalizada são as atuações extremamente exageradas, principalmente as do pároco Declan O’Brien (interpretado por Ronan Wilmot), que está sempre com uma expressão forçadíssima de tensão no rosto.



Mas é esse mesmo Declan O’Brien que acaba servindo como exemplo perfeito dos motivos que levaram Rawhead Rex a se tornar Cult. O personagem do pároco insano, que se torna um adorador do monstro Rawhead, brinda o público com as cenas mais memoráveis do filme, com destaque para a impagável cena do que poderíamos chamar de “batismo dourado”, quando o monstro resolve recompensar o pároco por sua servidão e dá uma urinada no religioso, para o deleite de O’Brien, que parece estar no ápice da alegria. Enquanto isso, o Reverendo Coot (interpretado por Niall Toibin), observa a cena de longe e, agindo como uma representação do público que está assistindo o filme, reage enojado, fugindo logo em seguida. Essa fuga termina com outra atuação amalucada do pároco O’Brien, que encurrala o reverendo e começa a fazer um discurso sobre quem é na verdade o monstro Rawhead, discurso esse que o pároco faz mantendo uma permanente cara de doido varrido e pontuando a fala com gritos, risadas forçadas e frases ridículas, em uma mistura simplesmente hilariante. O discurso, que deveria soar como algo solene e impactante, acaba arrancando risos involuntários, tamanho o exagero da performance do ator Ronan Wilmot.

O roteiro do filme é outro ponto a ser considerado. Embora tenha sido escrito pelo próprio Clive Barker, o roteiro apresenta diversos furos. Eu tive o trabalho de listar aqueles furos que me pareceram mais importantes:
- Qual é o verdadeiro objetivo do Rawhead e por que ele mata indiscriminadamente todas aquelas pessoas. Ele quer dominar o mundo? Quer ser adorado como um deus? Ou quer apenas tocar o terror?
- Como o Rawhead consegue converter as pessoas para que sejam totalmente leais a ele, a ponto de um chefe de polícia aceitar tocar fogo em todos os seus colegas e morrer queimado junto, apenas para agradar ao monstro. Controle mental? Hipnose? Possessão demoníaca?

- Por que o Rawhead somente pode ser derrotado daquela forma e como a personagem que acaba derrotando o monstro, soube como fazer para derrotá-lo. Ela recebeu uma mensagem do além? Foi possuída por espíritos antigos? Leu sobre isso em algum livro? Ou foi apenas um chute de sorte?
Todas essas questões ficam apenas jogadas na trama e nunca tem um desfecho claro. Mas isso não é um problema de verdade. A falta de coerência e explicações do roteiro apenas agrega um charme a mais ao filme.

Com um roteiro todo furado, atuações exageradas, muitas mortes grotescas, com muito gore mal feito, tudo aliado com as situações absurdas que o roteiro coloca na tela (como na cena em que o monstro ataca um acampamento de trailers e os moradores ficam parados vendo o monstro massacrar seus vizinhos, sem que ninguém resolva fugir ou se defender da criatura), contribuem para tornar o filme muito divertido, um perfeito exemplo dos melhores filmes de terror trash que, ao invés de meter medo, causam risadas incontroláveis. Talvez a única coisa bem feita do filme todo seja a fotografia, com belas paisagens da Irlanda rural, apresentadas em planos amplos e bem coloridos.

Como toda boa obra trash, não faltam as cenas de nudez desnecessária, diálogos ridículos, violência exagerada (mas não excessiva, nem demasiadamente gráfica) e perseguições dentro de casas e no meio de florestas. O cardápio completo.
Uma legítima podreira trash que merece uma conferida.


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